Uma equipe de pesquisadores brasileiros estudou a inovação tecnológica na China. Intitulado “Tecnologia e Competitividade em Setores Básicos da Indústria Chinesa: Estudos de Caso”, o trabalho foi realizado sob encomenda da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República. Adriano Proença e outros três professores do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), passaram dois meses e meio na China, entre o fim de 2010 e o começo de 2011. Visitaram 20 empresas, incluindo algumas companhias de alta tecnologia, de três setores selecionados pela SAE: eletroeletrônico, metal-mecânico e químico.
No estudo, os brasileiros destacaram uma das principais facetas da inovação tecnológica das empresas chinesas: o processo cumulativo de desenvolvimento tecnológico. A estratégia consiste em absorver tecnologia, assimilar o conhecimento adquirido via contratos de transferência tecnológica com empresas do mundo desenvolvido e aprimorá-lo. Nas universidades e centros de pesquisa, esse processo é chamado de inovação secundária, trabalho pelo qual uma empresa inova a partir de uma rota tecnológica conhecida.
“Essa é uma característica das empresas chinesas nas últimas três décadas. Pegam tecnologias maduras e inovam no fim da curva, mas avançam. São pequenos passos que, somados à massa do mercado interno e ao baixo custo de mão de obra, representam vantagens. Mas as empresas chinesas não estão preocupadas só com o mercado interno, elas nascem pensando em operar no mundo como um todo, globalmente”, diz Proença.
Um ponto importante é o envolvimento do governo federal, Estados e municípios, além de empresas, universidades e centros de pesquisa, em um jogo coletivo, à semelhança do que os chineses vêm fazendo. Nesse jogo, surge o papel coordenador do Estado. Um exemplo na China é o da energia eólica.
Os professores da Coppe visitaram duas empresas (Guodian e Tianwei, perto de Pequim), que desenvolveram projetos próprios de produção de turbinas eólicas a partir da sinalização do Estado, no ano 2000. Elas fizeram pesquisas sobre turbinas com o apoio de universidades – estimuladas a enviar doutorandos para o exterior – e acertaram processos de licenciamento de tecnologia. Hoje, as duas empresas têm em curso processos de inovação secundária, associados à compra e assimilação de tecnologias em transição.
Sérgio Camargo, um dos professores da Coppe que participaram do trabalho, diz que na China há um comprometimento da sociedade com a inovação tecnológica. O engajamento de diferentes agentes sociais com o desenvolvimento tecnológico se relaciona com o processo de planejamento do governo. Camargo destaca o papel da Academia Chinesa de Ciências, que tem mais de cem centros de pesquisa focados em diferentes temas, como energia ou nanotecnologia. Na academia, há mais de 100 mil alunos de pós-graduação.
A qualificação de mão de obra também tem feito a diferença em favor da China. O trabalho da Coppe mostra que o número de profissionais formados em nível superior saltou de 800 mil, em 1997, para mais de 5 milhões em 2009, sendo que cerca de 2 milhões se graduaram em ciências exatas e em engenharia. Os professores dizem que os salários na China estão evoluindo e que, em determinados cargos, as empresas pagam de acordo com o mercado global.
Na avaliação de Camargo, as empresas chinesas se preocupam mais em dominar o mercado do que com o lucro. “A preocupação com o lucro existe, mas não vem em primeiro lugar. A trajetória que as empresas chinesas que visitamos perseguem é o domínio do mercado dentro de uma visão de mais longo prazo.”
Além de inovar a partir de rotas tecnológicas existentes, as empresas chinesas analisadas também passaram a procurar, a partir da década passada, fazer investimento em alta tecnologia, área que também conta com apoio do governo chinês. Camargo cita o caso da tecnologia de iluminação LED. Entre o fim de 2008 e o começo de 2009, o governo chinês lançou um programa de incentivo à compra de máquinas de produção de LED.
“O governo decidiu custear a fundo perdido 50% do valor de cada máquina que fosse instalada na China”, diz Camargo. Segundo ele, em 2008 a produção de LEDs na China foi inferior a 1% da produção mundial. Em 2011, a China produziu 14% dos LEDs do mundo e, em 2012, o país será o maior produtor mundial dessa tecnologia de iluminação, com 32% da produção mundial, prevê Camargo.
Fonte: ANPEI