A irregularidade das chuvas em parte do Brasil, além de afetarem as lavouras de soja também começam a impactar os canaviais, que estão mais suscetíveis a perdas devido ao seu envelhecimento após anos de renovações aquém do ideal, segundo especialistas.
A cana-de-açúcar é, a princípio, mais resistente do que a soja em momentos de adversidades climáticas, mas, mesmo assim, as precipitações longe da normalidade e temperaturas elevadas das últimas semanas acendem o sinal de alerta no setor quanto a uma potencial queda de produtividade, justamente pela maior debilitação das plantações.
Problemas na safra 2019/20 do Centro-Sul do Brasil, que tem início em abril, poderiam mexer ainda mais com o balanço de oferta global de açúcar, cujas estimativas nos últimos meses têm passado de superávit para déficit, com provável reflexo nos preços da commodity na bolsa de Nova Yorque, ICE.
Assim, os boletins meteorológicos indicando baixo índice de chuvas geraram uma onda de compras especulativas. Após um dezembro com precipitações abaixo da média histórica no Centro-Sul, novas previsões assim para janeiro levantaram receios sobre uma eventual quebra na safra de 2019/20, que começa em abril.
“As pessoas começaram a ficar mais apreensivas. Mas só vai ter quebra se a seca se prologar até o fim do trimestre”, afirmou Henrique Akamine, gerente de análise de mercado da trading Czarnikow. Ele avalia que os preços podem subir até os 13 centavos de dólar a libra-peso, mas que é mais provável “andarem de lado” no curto prazo.
“Novembro foi um mês bom (de chuvas) e dezembro deixou a desejar. Ainda é um pouco cedo para falar como pode ser o impacto, mas as usinas estão um pouco preocupadas… Se a gente começar a ver que janeiro segue da mesma forma, a preocupação vai ficar maior e vai afetar as expectativas de maneira mais expressiva para 2019/20”, afirmou o head de açúcar e etanol da INTL FCStone, Bruno Lima.
Para a safra que começa em abril no Centro-Sul, a consultoria já prevê uma moagem ligeiramente menor na comparação com 2018/19 por causa da idade avançada dos canaviais, que está na casa de 3,8 anos. A expectativa é de um processamento de 564,7 milhões de toneladas. “O canavial está debilitado”, resumiu.
Na avaliação do agrometeorologista Marco Antonio dos Santos, sócio-diretor da Rural Clima, as reformas de plantações até estão ocorrendo, “mas ficam para 2020”.
“Talvez não tenhamos uma produção maior que a de 2018”, disse. “As chuvas irregulares estão trazendo apreensão para os produtores, porque, além disso, as temperaturas também estão elevadas, o que impulsiona a evapotranspiração das plantas. A cana está passando por problemas, assim como outras culturas.”
Para ele, “vai ter uma redução [na safra de cana] por causa do clima, mas o que mais vai acentuar é a idade do canavial”.
Dados do Agriculture Weather Dashboard, do Refinitiv Eikon, mostram que as chuvas em São Paulo, principal produtor de cana do Brasil, ficaram abaixo da média em todas as regiões do estado nos últimos 30 dias. Em Ribeirão Preto, maior polo canavieiro do país, choveu 141,8 milímetros a menos.
As precipitações também foram inferiores em Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais, outros importantes produtores de cana. No Triângulo Mineiro, por exemplo, foram 121,3 milímetros a menos do que a média para esta época.
Além disso, a previsão para as próximas duas semanas não é das melhores. O Centro-Sul como um todo receberá chuvas abaixo do normal, com Ribeirão Preto e o Triângulo Mineiro com precipitações 36,6 e 60,8 milímetros aquém da média, respectivamente.
Santos, da Rural Clima, explicou que a razão por trás dessa irregularidade é o chamado El Niño Modoki, um aquecimento heterogêneo das águas do Oceano Pacífico. Em alguns momentos, o comportamento climático se assemelha mais a um La Niña, destacou.
“Sem a influência direta de um fenômeno climático (El Niño/La Niña), as frentes frias e os corredores de umidade ficam extremamente voláteis, cada momento em uma região da América do Sul. Por isso, as chuvas estão ocorrendo, mas sempre na forma de pancadas irregulares”, afirmou.
Produtores das principais regiões de soja do Brasil já relataram perdas de produtividade devido à irregularidade climática. A quantificação dos problemas, no entanto, tem sido difícil até o momento.
Texto da Reuters com informações adicionais do Valor Econômico
Edição novaCana.com